sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Permacultura - Origem e Ética

A Permacultura foi criada pelos australianos Bill Mollison e David Holmgren nos anos 70. Seu principal objetivo, declarou Holmgren, é a criação de “paisagens conscientemente desenhadas que reproduzem padrões e relações encontradas na natureza e que, ao mesmo tempo, produzem alimentos, fibras e energia em abundância e suficientes para prover as necessidades locais”¹. Ela é um método de se planejar espaços totalmente sustentáveis, que visa à criação de uma cultura que seja sustentável e permanente. As áreas chaves para a criação dessa cultura foram mostradas através da “Flor do Sistema de Design”(imagem 1). Mais conhecida como a flor da permacultura, ela apresenta 7 campos (7 pétalas) em que a permacultura age. Em cada uma das pétalas são especificadas algumas ações de grande importância. A elaboração da flor foi baseada em uma série de princípios éticos. Esses princípios estão no centro da flor. Dessa forma, me permito dizer que a ética da permacultura é como o seu âmago.
Imagem 1

Imagem 2

Bill Mollison resumiu essa ética em 3 valores (imagem 2): cuidar da terra, cuidar das pessoas, e partilha justa (limites ao consumo). 
- Cuidar da Terra
“O ícone da planta jovem representa o crescimento orgânico, um ingrediente-chave na manutenção da vida na Terra. Cuidar da Terra pode ser entendida como cuidar do solo vivo. O estado do solo é freqüentemente a melhor medida para a saúde e o bem-estar da sociedade. Há muitas técnicas diferentes para se cuidar do solo, mas o melhor método para saber se o solo está saudável é ver quanta vida existe lá. Nossa florestas e rios são os pulmões e veias do nosso planeta, que ajudam a Terra a viver e respirar, proporcionando diversas formas de vida. Todas as formas de vida têm o seu próprio valor intrínseco, e precisam ser respeitados pelas funções que elas executam - mesmo se não as vemos tão úteis às nossas necessidades”². Em outras palavras, esse princípio presume a manutenção dos ecossistemas, e o respeito por todo e qualquer elemento terrestre.
- Cuidar das Pessoas
“O ícone das duas pessoas juntas representa a necessidade de companheirismo e trabalho colaborativo para proporcionar mudanças
. O cuidado com as pessoas começa com nós mesmos, mas se expande para incluir as nossas famílias, vizinhos e comunidades locais e mais amplas”². Esse princípio está intimamente ligado com o primeiro, uma vez que temos que cuidar da terra para cuidarmos de nós mesmo, e assim cuidarmos dos outros. O “outro” é encarado positivamente, sendo uma potencial solução e não um problema. Dessa forma, todos os animais humanos merecem respeito, saúde, alimentação, abrigo, educação, e trabalho.
-Partilha Justa
“O ícone da torta e uma fatia dela representa a tomada do que precisamos e a partilha do que nós não necessitamos, reconhecendo que há limites para o quanto podemos dar e o quanto podemos tomar”²
. Temos que olhar para o atual padrão de vida, para o consumismo desenfreado, para as espécies que estamos aniquilando, e perceber que desse jeito e nessa velocidade não há um futuro próspero para a humanidade. A sociedade pode mudar esse cenário. Mas, como disse Bill Mollison, “isso requer repensar os valores, um replanejamento dos nossos hábitos e uma redefinição dos conceitos de qualidade de vida”³.


 Com os princípios esclarecidos, partimos para o estudo do funcionamento dos sistemas permaculturais. 

Uma das mais importantes características dos sistemas de permacultura é que nenhum deles é igual. Se olharmos para duas casas de permacultura numa mesma cidade, com duas famílias muito parecidas (educação, religião, entre outras coisas), perceberemos que as diferenças são mais que notáveis. Cada caso é realizado segundo suas próprias e únicas condições, sejam elas culturais ou territoriais. Mas existem sempre algumas semelhanças fundamentais:

- Respeito pela natureza: expresso ao cuidá-la, estudá-la, e preservá-la.
- Reciclagem da energia do sistema: inclusive a humana.
- Problemas são encarados como solução: a comida não gera lixo, e sim matéria prima para produzir adubo para a horta.
- Todos os elementos estão conectados para que exista apoio mútuo: a casa disponibiliza materiais para produção artística (lixo). Os produtos podem retornar para a casa ou serem trocados (vendidos) por comida. Esse alimento proporciona energia para a produção. E assim por diante.
- Toda função é suportada por pelo menos dois elementos: tem água do rio, da chuva, ou de um poço, por exemplo.
- Todo elemento tem mais de uma função: a bananeira digere materiais e protege o solo, as suas folhas podem servir de adubo, e seus frutos são alimento.

Sem dúvida há mais algumas características comuns dos sistemas permaculturais para relatar. Mas acabei de tocar em um item que exige mais atenção.
Quando estava fazendo a formação em permacultura (PDC- Curso de Design em Permacultura) vivenciei uma situação no mínimo curiosa. No momento em que aprendíamos sobre o último ícone da lista, o elemento usado como exemplo foi a galinha. Suas funções estavam sendo listadas. Ao ciscar ela limpa o chão. Ao andar ela areja a terra. Ao defecar ela serve para produzir matéria orgânica. E ela produz alimento através da sua carne e de seus ovos. Muito perturbada com a situação, arrisquei dizer: “ela também SERVE como companhia”. Depois das risadas, todos concordaram comigo. Afinal, os permacultores respeitam a todos.

Como podemos ter uma ética que respeita a natureza (incluindo todas as espécies de animais), se ao executá-la não respeitamos o direito de um animal viver para não nos servir?
Poderiam me dizer que se levássemos essa minha idéia a fundo, a solução seria o isolamento do animal humano. Afinal, quando a galinha está cagando e andando ela já está nos servindo de alguma coisa.
Não tenho dúvida que ela realmente trás benefícios ao fazer isso. Mas acontece que ela não foi parar naquele lugar ao acaso. Pelo menos não é assim que vejo acontecer. Não prego pelo isolamento dos homens. Desejo uma convivência pacífica entre toda a natureza, uma relação de igualdade entre todos os terrestres.
O que digo não é inviável. E para minha felicidade, essa idéia “maluca” de entender que todas as formas de vida têm o seu próprio valor intrínseco é justamente o que a ética da permacultura estabelece.




¹ HOLMGREN, David. Permacultura Um: um sistema de agricultura perene para assentamentos humanos. Tagari Publications. 130p.

² Disponível em: <http://permacultureprinciples.com> Acesso em: 30/09/2011
³ MOLLISON, Bill. Permaculture: a designers´ manual. Tagari Publications. 576p.

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Como tudo começou...



Há 5 anos atrás esbarrei com um vídeo amador gravado em uma favela. Ele mostrava a aplicação e resultado de um sistema integrado que ao tratar o esgoto de alguns “barracos” produzia biogás para as famílias carentes. E assim tive o primeiro contato com uma das coisas mais interessantes que conheci nessa vida.
Na época, eu não sabia nada sobre a origem, o nome, e sobre a complexidade do tema. Mas tinha a certeza que o que via era uma fantástica descoberta, e uma potencial solução para alguns problemas da caótica São Paulo.

1 ano após o episódio eu tive a honra de conhecer o meu mais excêntrico professor de física. Um judeu com uma mente inquieta e com muito conhecimento. Sua mente era imaginativa, e seu coração esbanjava bondade. Ao seu lado, descobri a “arquitetura inteligente”: construções que economizam, reaproveitam e criam os próprios recursos (edifícios independentes). Devido as nossas conversas, senti a certeza da profissão que desejava seguir.

No final desse ano, também vivenciei uma crucial conversa para a minha vida. Em uma noite qualquer, jantando com um amigo que compartilhava o gosto por polêmicas, o acaso nos introduziu ao universo da alimentação vegetariana. Como de costume, escolhemos lados opostos para dar início ao debate. Eu, inexplicável simpatizante, optei pela defesa. O diálogo se desenvolveu até beirar o absurdo. E assim, reconhecemos que nossas palavras agiam como facas cegas, que insistíamos numa discussão em que nenhuma das partes entendia do assunto. Dessa forma, acordamos de pesquisar sobre o tema antes de dar continuidade ao hobbie. Inquieta, fui atrás de informações na mesma noite. Almejando a irreal vitória, pesquisei sobre os dois lados da moeda. Queria ter boas respostas para todas as abordagens possíveis. E foi no meio dessa incansável busca que me dei conta que o que descobria ia muito além daquela brincadeira. A veracidade e a força do que aprendia me atingiam profundamente. Sem querer, eu havia plantado uma semente em meu próprio corpo. E após 1 mês (10 de Janeiro de 2008), me encantei com uma vigorosa e estabelecida consciência.

Iniciei o ano bem, e, sem grandes esforços, o primeiro semestre de 2008 foi marcado como uma época de muito estudo e pesquisa sobre nutrição, culinária, direitos animais, e arquitetura sustentável. Em pouco tempo, compreendi a ética vegana o suficiente para tentar mudar alguns outros hábitos. Pela primeira vez na minha vida, agradeci por ter nascido com uma séria alergia a leite. E então, o dia 10 de Junho de 2008 foi registrado como o início da minha vida vegana.
Nesse ano de novidades e ansiedades, também iniciei um curso técnico em meio ambiente (além do colegial e cursinho). Mas acabei desistindo em poucos meses (por uma razão bem difícil de deduzir). O tempo que estive lá foi ótimo para me inspirar muito na minha pesquisa por formas sustentáveis de viver. E também foi o suficiente para eu enfim conhecer um permacultor. Uma vez apresentada a permacultura, nunca mais consegui esquecê-la.
Durante algum tempo (mais do que eu gostaria), meu estudo sobre a “cultura permanente” se limitava à internet. Mas depois, com bastante teoria acumulada e guardada, me lancei às vivências permaculturais.

Em 2010, durante um voluntariado em uma casa de permacultura, ouvi uma frase que nunca pude esquecer: “Essa coisa de veganismo só é possível na cidade”. A opinião da pessoa era que o veganismo era uma espécie de febre urbana, que só faz sentido para quem vive num local “sem animais e sem natureza”. Isso me causou um grande impacto. Mas para minha surpresa, a afirmação não vinha somente desse lado. Acho que eu não saberia dizer a quantidade de vezes que ouvi a seguinte frase: “a permacultura só é viável pro campo”. Esse argumento é sustentando por diferentes profissinais, amigos ou conhecidos. Mas se tem uma coisa em comum é a razão da afirmação: a permacultura não faz sentido para quem vive na cidade.
Bom, esse assunto me levou a longas reflexões. Eu discordo de ambas afirmações. Mais que isso: eu enxergo uma profunda conexão entre os temas. E esse é o ponto em que tentarei chegar nesse blog.

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Para começar bem...

‎"Muita gente pequena, em muitos lugares pequenos, fazendo coisas pequenas, mudarão a face da terra." (Provérbio Africano)